Eu estou tomando meu café, enquanto o mundo está virando de ponta cabeça; lá fora chove, aqui dentro é frio, e eu sou vazia.
Hoje sou vazia.
A vida não me presenteou com o prazer de pedalar uma bicicleta sem rodinhas; ela nunca me deu a chance de aprender a me virar sozinha, todavia tive um apoio ali, me segurando, me firmando no meu desiquilibrio - os medos sempre foram meus amigos, aqueles que me impediram de cair, aqueles que evitaram minhas feridas.
Mas o tempo vai passando, você vai crescendo ... as pessoas crescem, elas evoluem - pro bem ou pro mal elas evoluem, e logo você se torna alvo de piada por não saber pedalar sem as rodinhas;
aquilo que outrora era tão comum, tão vital, aquilo que era o seu equilibrio lhe é tirado, quando lançam em tua face que por seres grandinha não é capaz de equilibrar-se sozinha.
As risadas, os comentários maldosos, as expressões despeitosas te intimidam, e você resolve abandonar as rodinhas -
A primeira tentativa é frustrante, você sequer tenta dar a primeira pedalada. Olha o horizonte, em seguida mira com fervor a roda dianteira, mas o que você está ouvindo é mais uma gravação de gargalhadas repetidas. E você tenta, movimenta o guidon de um lado para o outro, a bicicleta pende para um lado, você apoia os pés no chão para evitar a queda. O medo é capaz de evitar muitas coisas.
Na segunda tentativa, você se isola, vai até onde ninguém é capaz de ir sozinho, você vai sem medo - você vai.
Senta na bicicleta, mais uma vez olha o horizonte, e se pergunta se é capaz de chegar até a linha que define o fim ou o começo de um novo caminho, você mais uma vez mira com obcessão a roda dianteira, mas dessa vez mantém, seus pés no chão. E o que você ouve dessa vez é o medo rindo pela suas costas; eu te vi apavorada naquele dia, tão pequena e se achando tão grande, o mundo te fez acreditar que era grande demais pra se apoiar nas rodinhas - nas suas rodinhas. Eu te vi descer daquela bicicleta e ir arrastando-a até em casa. Te vi se trancar no quarto e chorar, eu vi o que eras, eras uma criança sozinha a chorar.
Na terceira tentativa, era uma dessas noites quentes de verão, onde todos ficam ate tarde sentados na calçada contando piadas, ou fazendo de pessoas piadas maldosas. Você arrasta sua bicicleta até lá, confiante, determinada, segura ... você ainda está a ouvir as gargalhadas repetidas, mas isso não te abala, me pareces uma guerreira encarando seu maior fracasso, você estava tão séria ...
Senta na bicicleta, encara o horizonte como algo idiota demais, como algo que qualquer um, menos você pode alcançar, você mira com ira aquela roda dianteira e então o show começa ...
um pé é colocado no pedal direito, até aí tudo muito fácil; em seguida o outro pé vai se erguendo para se apoiar no outro pedal - a bicicleta parece estar viva, as gargalhadas parecem mais altas, você já não está mais tão confiante assim - o guidon mais uma vez se movimenta de um lado para o outro, você tenta desesperadamente buscar o seu equilibrio - eu vi lágrimas nos teus olhos garota! NÃO CHORES, VÁ E PEDALE, NÃO PARES, PEDALE!!
mas o que se ocorre em seguida é uma queda vergonhosa, tudo parece se movimentar em câmera lenta diante de seus olhos, a bicicleta foi pendendo para um lado, e você criança, ah criança ... era chegado a hora de apoiar os pés no chão, mas voce sentiu necessidade de provar alguma coisa pra qualquer pessoa, acho que foi pra si mesma, de que era capaz de mantes os pés no pedal, mesmo caindo ... e você caiu, e o que se sucedeu foi a bicicleta caindo por cima de ti, teu braço ralava o chão; ardia, eu senti dor, o sangue escorreu , e você chorou.
E todos riram. Pude te ver ali tão desamparada, aos prantos, não pela dor, mas pela decepção, você se sentiu fracassada, eu vi você chutar a bicicleta e correr para casa. Sozinha, pois filha única não tem irmãos, e menina rica não tem amigos.
Descaradamente eu vi um muleque montar em sua bicicleta e sair pedalando, como se de fato aquilo fosse algo muito inútil.
Na quarta tentativa ... bom, não teve quarta tentativa. Você não tentou mais, você abandonou a bicicleta, inclusive as rodinhas. Isso já não tinha mais tanta graça pra você. Você se achava grande demais, você já não se aceitava. E a vida tornou-se um fardo pra tí, e a solidão tomou espaço em teu coração; e eu já não te vias mais brincar até tarde aos fins de semana, já não via seus brinquedos espalhados pela casa, já não via a tv ligada com teus desenhos favoritos; seu pai chegava ancioso do trabalho pra te dar um abraço, e onde estavas? Estavas dormindo, às 19:00h já estavas a sonhar com aquele horizonte, 7 dias da semana estavas a engolir livros e mais livros, enquanto teu pai engolia a seco o fato de que estavas crescendo e de que não aceitavas mais as rodinhas da vida, rejeitavas todo o apoio. Os fins de semana, eram todos iguais, acordavas cedo, tomavas teu café, e ia sentar na calçada para ler teu livro, sozinha.
Aqueles que pensavam ser teus amigos, lhe chamavam pra brincar, você fazia uma cara de séria e continuava a ler. Subia para almoçar, e não mais dialogava com teu herói, teu pai.
Eu te vi crescer cedo demais, eu te vi sofrer cedo demais, eu te vi desistir cedo demais!!
VAMOS VOLTE A TENTAR, TENTE PEDALAR!!
Na quinta tentativa ... bom, essa foi a mais covarde de todas.
Você já não se achava grandinha, se achava uma adulta cheia de problemas, mas que grotesco, só tinhas 13 anos criança!
Eu te vi apanhar injustamente, eu te vi ser ameçeada, eu te vi ser o alvo de muitas frustrações. Eu vi os comentários que rolavam por tua antiga casa, você não era a filha do casal, era a filha do teu pai. Óbvio que eras, mas e da madrasta? Bom, a madraasta era estéril. E você por inúmeras vezes apanhou por isso, até que eu te vi enxergar o horizonte mais uma vez ...
Eu te vi implorar pra machucar teu herói, teu pai. Eu te vi machucá-lo bruscamente, sim criança, mesmo tão pequena você o fez chorar, você o magoou, você o deixou.
Eu via, você era o único bem, o único tesouro que aquele herói possuia, e você o deixou, você o fez chorar! Eu vi!
Você olhou para o horizonte, mirou indiferente a roda dianteira e o deixou.
Esqueceu criança, de que tuas rodinhas sempre fora teu pai?
Penso que sim.
Na sexta tentativa ... bom, vejamos ...
você aind anão cresceu, já tens 17 anos - faltam 2 meses para os 18 - e ainda não cresceu. Ainda me parece uma criança, ainda te vejo chorar pelos cantos, ainda te vejo falar sozinha diante do espelho. Você tem dois irmãos por parte de mãe agora, mas já não é mais filha, e você também já não mais aquela menina rica.
Você ainda não sabe andar de bicicleta, e pelo que vejo, não faz a mínima questão de aprender, mas sentes falta das rodinhas, isso eu posso ver com clareza.
Sem rodinhas não há equilibrio, mas foi você mesma quem deixou as rodinhas pra trás, se achou grande demais, e agora tão carente de um novo horizonte, se sente pequena e indefesa demais.
Não sou capaz de compreendê-la, você chora sem saber o motivo, você abraça qualquer pessoa procurando um rodinha a mais, mas agora pessoas grandes que se acham pequenas, não precisam de rodinhas.
Você nunca aprendeu a se virar sozinha.
Sempre procurando apoios, e quando não os procura, chuta, sai correndo, e foge.
Na sétima tentativa ... você senta numa cadeira, escuta músicas depressivas e posta em blogs.
Procura rodinhas, mas pessoas grandes feito você já não precisam de rodinhas, não é mesmo?
Procura bicicletas, mas pessoas que não sabem pedalar os próprios sentimentos não precisam de bicicletas não é mesmo?
Então vá e continue lendo.
NÃO TENTES PEDALAR MAIS, POIS EU CANSEI DE VOCÊ CRIANÇA !!
Isso dói?
Pois bem, saiba que teu pai também sentiu dor quando que por covardia você o deixou!!
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Nota final: Nunca gostei de crianças, principalmente as choronas feito você Jéssica!
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